quinta-feira, 21 de março de 2019

Artigo de opinião - Será que há dinheiro para os professores?

 


O Governo alega que o País não tem dinheiro para contabilizar todo o tempo de serviço aos professores.
Esta perspetiva é muito discutível. Tudo depende das estratégias e das opções políticas que se pretendem para o País.






A opção política deste governo foi utilizar o dinheiro dos contribuintes para financiar a Banca.

Vamos analisar o exemplo da opção de criação do “Fundo de Resolução” (doravante designado por Fdr). Transcrevo o que se encontra no site do mesmo: “O Fdr foi criado em 2012 com a missão de prestar apoio financeiro às medidas de resolução aplicadas pelo Banco de Portugal, na qualidade de autoridade nacional de resolução”.

Aparentemente este fundo não teria custos para os contribuintes Portugueses, porque seria financiado pela própria Banca para salvaguardar questões emergentes.

Vamos averiguar se é mesmo assim, com o caso concreto do Novo Banco:
Em 2015 o Banco de Portugal capitaliza o Novo Banco em 2,9 mil milhões de euros;

Em 2016 o Estado Português empresta ao Fdr 3,9 mil milhões de euros, à taxa de 1,25%, quando o custo médio de contratação de dívida do estado, nesse ano, foi de aproximadamente 3,6%. Isto implica, no mínimo, uma perda de 2,35% ao ano;

Em 2017 o Estado Português revê a taxa de empréstimo ao Fdr para 2% até 31-12-2021, revista de 5 em 5 anos, com o prazo de reembolso até 2046;

Em 2017 o Fdr contraiu um financiamento de mais 1000 mil milhões de euros, nas instituições Bancárias;

O financiamento total ao Novo Banco, até 2017, foi de 6,9 mil milhões de euros (5,9 mil milhões de euros dos contribuintes Portugueses);

Em 2017 o Fdr vende 75% do Novo Banco à Lone Star por 1000 milhões de euros (750 milhões de euros a entregar em 2017 e 250 milhões em 2020), ficando o Fdr detentor de somente 25% do capital do Novo Banco;

Mas o prejuízo ainda não fica por aqui, pois ainda poderemos ter que injetar mais 3,9 mil milhões de euros, como podemos constatar, pelas declarações feitas por um membro do atual Governo em 2018 à imprensa e passo a citar: “para se conseguir vender o banco e eliminar a incerteza, teve de se aceitar o compromisso do Fundo de Resolução de injetar um máximo de 3,89 mil milhões de euros no Novo Banco até 2025 para cobrir perdas com um conjunto de ativos vindos ainda do antigo BES”.
Concluindo, no total, até 2017, o Novo Banco teve um investimento de 6,9 mil milhões de euros e vende 75% do capital investido por 1000 milhões de euros. Perdemos aproximadamente 5,9 mil milhões de euros e ainda vamos continuar a assumir possíveis perdas até 2015, que podem ascender a um máximo de 3,89 mil milhões de euros.

Vamos agora analisar a reivindicação dos professores, que pretendem a contabilização do tempo de serviço na carreira, à semelhança do que aconteceu na restante função pública “o reposicionamento na carreira do tempo congelado”. Note- se que não pretendem quaisquer retroativos do tempo congelado.

Em 2017 o Governo comprometeu-se com os sindicatos, através de uma “declaração de compromisso”, assinada em 18 de novembro de 2017, na qual ficou bem claro:
“5.a) definir como base negocial para a construção do modelo três variáveis fundamentais: o tempo, o modo de recuperação e o calendário em que o mesmo ocorrerá;

5.b) negociar nos termos da alínea anterior o modelo de recomposição da carreira que permite recuperar o tempo de serviço;

5.c) garantir que desse acordo não resultem ultrapassagens.”

Esse acordo foi reforçado com a Resolução no 1/2018 da Assembleia da República, aprovada por unanimidade, incluindo os votos do Grupo Parlamentar do PS, o qual recomenda ao Governo a recuperação de todo o tempo de serviço, negociando com os sindicatos o prazo e o modo. Essa mesma medida ficou plasmada no artigo 19o do OE de 2018.

Mais uma vez o Ministério da Educação não cumpriu nem o acordo, nem a recomendação nem a Lei do OE, o que obrigou a Assembleia da República a voltar a incluir, no OE de 2019, a obrigatoriedade do ME negociar o prazo e o modo da recuperação do tempo de serviço.

Em 2019, o ME simula uma negociação e, de uma forma unilateral, contra tudo e contra todos, promulga o Decreto Lei que prevê a recuperação de 2 anos 9 meses e 18 dias, subtraindo aproximadamente 6,5 anos da vida aos professores.

O ME não aceitou sequer discutir as propostas dos sindicatos, que mitigam no tempo os efeitos financeiros da recuperação do tempo de serviço. Além disso gerou uma plena confusão na carreira docente – as ultrapassagens de docentes com menos tempo de serviço por docentes com mais tempo de serviço.
Será que estamos perante uma estratégia concertada para gerar atritos entre as próprias classes para desviar as atenções de outras questões?

Está agora nas mãos do Parlamento a decisão de apresentar uma vez por todas um plano de compromisso para com os professores e repor a justiça.

Para emprestar dinheiro à Banca e perder o dinheiro dos contribuintes, é possível fazer uma “operação financeira” e ter uma estratégia política até 2046, mesmo que isso implique o empobrecimento dos trabalhadores e da população em geral. Mas para o reposicionamento dos professores e para o ensino em geral, já não há planeamento nem políticas estratégicas.



Porto, 21 de março de 2019

José António Barata

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